O Dia Nacional da Luta Contra a Dor assinala-se a 20 de outubro. Pedro Branquinho, anestesiologista e responsável pela consulta da dor no CNS – Campus Neurológico, explicou como a dor pode estar presente nas doenças neurológicas e qual a importância do acompanhamento por um especialista para a qualidade de vida dos doentes.
Pode destacar a relação entre a dor crónica e doenças neurológicas?
Pedro Branquinho (PB) – A dor crónica (dor persistente com duração superior a 3 meses) afeta entre 20 e 40% dos doentes com patologia neurológica primária e pode contribuir gravemente para a diminuição da sua qualidade de vida. O diagnóstico e abordagem da doença neurológica devem ser acompanhados do tratamento dos sintomas de dor, de forma a evitar a cronicidade.
Quais são os tipos de dor mais comuns associadas a doenças neurológicas?
PB – A dor pode ser classificada como neuropática, quando tem origem no sistema nervoso (central ou periférico), ou nociceptiva, quando está associada a lesão de outros órgãos.
Dependendo do tipo de doença neurológica é possível encontrar um ou outro, ou, por vezes, ambos os tipos de dor. Por exemplo, em doenças como Esclerose Múltipla ou após um Acidente Vascular Cerebral (AVC) é possível existir dor neuropática de origem central, enquanto nas doenças do movimento, como a Doença de Parkinson, a dor presente está mais associada a inflamação muscular e articular ou a espasmos musculares.
Quando é que se deve considerar marcar uma consulta da dor?
PB – Quando estamos na presença de queixas de dor de longa duração, com compromisso das atividades de vida diária e que não resolve apesar da utilização de medicação analgésica habitual.
Qual é o papel de um especialista da dor e como pode ajudar a gerir condições dolorosas?
PB – Todos os médicos estão familiarizados com medicação convencional para a dor. No entanto, na presença de dor intensa apesar da medicação instituída, a atuação do especialista em dor permite uma avaliação abrangente da síndrome dolorosa com propósito de estabelecer um plano de tratamento ajustado ao doente. A partir deste momento a gestão da dor é feita pelo médico especialista em dor através de uma abordagem multidisciplinar, avaliação da necessidade de escalada terapêutica e realização de técnicas analgésicas, se houver indicação.
Quais são as opções de tratamento não farmacológico disponíveis para lidar com a dor em pacientes com doenças neurológicas? Existem estratégias de prevenção da dor que os pacientes possam adotar?
PB – Podemos tratar a dor crónica através de fármacos ou técnicas minimamente invasivas, mas é importante complementar com outro tipo de abordagem, como o apoio psicológico, a fisioterapia ou a alteração do estilo de vida (por exemplo, optar por uma alimentação mais saudável e equilibrada, e pela prática regular de atividade física). Apenas desta forma é possível abordar a dor crónica em todas as suas vertentes e esperar uma melhoria mais consistente das queixas.
Quais são os desafios mais comuns enfrentados pelos pacientes com doenças neurológicas em relação à dor? Como é que o tratamento da dor nas doenças neurológicas pode melhorar a qualidade de vida do paciente?
PB – O tratamento da dor em doentes com doença neurológica torna-se desafiante pela complexidade no seu diagnóstico e na dificuldade em encontrar um tratamento eficaz. As comorbilidades dos doentes, associadas à necessidade de múltiplos fármacos, podem complicar ou limitar a abordagem do médico no tratamento da dor. Com uma avaliação e intervenção precoces da dor é possível aliviar as queixas e, potencialmente, melhorar a qualidade de vida dos doentes.
Quais os recursos que estão disponíveis para apoiar os doentes na gestão da dor relacionada a doenças neurológicas?
PB – No CNS dispomos de uma equipa multidisciplinar com diversas especialidades médicas, enfermeiros e terapeutas, que trabalha para garantir o melhor apoio aos doentes em sofrimento. Em situações específicas, a realização de técnicas percutâneas com auxílio da ultrassonografia complementa a atuação do médico e pode potenciar o alívio das queixas.
Que mensagem gostaria de deixar neste Dia Nacional da Luta Contra a Dor?
PB – A dor crónica está presente em mais de um terço da população portuguesa e é transversal à prática médica. Esta deve ser valorizada e diagnosticada de forma a iniciar o melhor tratamento o mais precocemente possível, de forma a minimizar o seu impacto e melhorar a qualidade de vida do doente.