A Paralisia Cerebral (PC) é uma condição que afeta a capacidade de movimento e postura, causada por uma lesão ou anomalia no cérebro em desenvolvimento (até aos 3 anos de idade). Esta lesão é permanente, mas os sintomas podem mudar ao longo do tempo com o crescimento e tratamentos. A PC é a deficiência motora mais comum na infância, afetando cerca de 2 em cada 1000 nados-vivos.
Existem três formas principais de PC:
- PC Espástica (80% dos casos): causa rigidez muscular e pode afetar um ou mais membros, como no caso da hemiparesia (um lado do corpo), diplegia (principalmente as pernas) ou tetraparesia (todos os membros).
- PC Disquinética (10-15%): inclui a forma distónica (caracterizada por rigidez muscular) e a forma coreoatetósica (marcada por movimentos involuntários e descoordenados).
- PC Atáxica (5%): envolve problemas de equilíbrio e coordenação, causando tremores e dificuldade em manter a postura.
Além das dificuldades motoras, as pessoas com PC podem ter outros problemas, como dificuldades visuais e/ou auditivas, atraso no desenvolvimento intelectual, epilepsia, problemas ortopédicos, gastrointestinais, respiratórios ou dentários.
Tratamento e Cuidados
A abordagem do doente com Paralisia Cerebral (PC) deve focar-se numa perspetiva funcional. A intervenção deve ser planeada com base em objetivos definidos em conjunto com a criança e a família, sempre com o intuito de atingir o maior nível de autonomia possível – especialmente nas atividades diárias – e garantir a sua participação ativa na comunidade. O objetivo principal é melhorar tanto a qualidade de vida como a longevidade da pessoa.
Para atingir estes objetivos, é necessária uma abordagem multidisciplinar, integrada e personalizada, adaptada ao tipo de PC, à idade da criança e às condições associadas. O tratamento pode envolver várias áreas, como: fisioterapia, terapia ocupacional, terapia da fala, psicologia, cuidados médicos e de enfermagem, apoio educativo especializado e formação profissional. Além de apoio social, ajudas técnicas e apoio domiciliário.
Os cuidados médicos devem abranger todas as condições associadas à PC. Para isso, é fundamental o envolvimento de vários intervenientes, como a família, os profissionais de saúde, a escola, centros de intervenção multidisciplinar (CPC, LDM), unidades de cuidados continuados/apoio domiciliário, centros de formação adaptada (CERCI, entre outros) e a Segurança Social.
Reabilitação e Tratamentos
A reabilitação visa melhorar a postura e a função motora, envolvendo fisioterapia, terapia ocupacional e o uso de meios técnicos, como as ortóteses (dispositivos de suporte para membros ou coluna). Em alguns casos, também se recorre a tratamentos farmacológicos, como a toxina botulínica, e a intervenções cirúrgicas, como a bomba de baclofeno intratecal, a rizotomia dorsal (para tratar a espasticidade) e a estimulação cerebral profunda (para tratar as formas disquinéticas).
A toxina botulínica, combinada com a fisioterapia, é uma das principais opções terapêuticas, sendo fácil de utilizar e trazendo benefícios claros para o doente. Quando injetada num músculo, provoca uma paralisia localizada e temporária, aliviando a rigidez muscular ao atuar na ligação entre o nervo e o músculo.
Este tratamento é muito utilizado para a espasticidade em crianças a partir dos 2 anos de idade, especialmente nos membros superiores e inferiores. A toxina botulínica melhora a mobilidade, reduz a dor e facilita os cuidados de conforto. Combinada com a reabilitação e outros tratamentos, contribui para o desenvolvimento motor, melhora a função e previne complicações ortopédicas. Os efeitos secundários são raros e, geralmente, leves, e a duração do efeito é de 3 a 4 meses. Quanto mais cedo se inicia o tratamento, maior é a sua eficácia. Em casos de espasticidade mais extensa, podem ser necessárias várias injeções. Em pediatria o procedimento é feito, geralmente, com sedação. Muitas vezes, também se recomenda o uso de ortóteses (durante o dia e/ou a noite) para manter os ganhos obtidos. Durante o período de ação da toxina, é fundamental continuar ou até aumentar a frequência das sessões de fisioterapia.
Este tratamento também pode ser utilizado para controlar o excesso de salivação, através de injeções nas glândulas salivares.
Dra. Sofia Quintas, Neuropediatra
CNS – Campus Neurológico